Manauaras são contra o desmatamento e querem manter a floresta em pé

Se no século passado a floresta era vista, aos olhos de muitos habitantes da Amazônia, como um atraso ao desenvolvimento econômico e social, hoje essa percepção foi alterada para uma noção que reconhece a importância da conservação ambiental e da manutenção da floresta em pé. Quem pensa dessa forma é a população da maior cidade da Amazônia, Manaus, no Amazonas, segundo demonstram os resultados de uma pesquisa realizada pela Action Pesquisas de Mercado, sob encomenda da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS).


Foram ouvidos 1.018 moradores da área urbana da capital amazonense, com idades entre 16 e 70 anos. O objetivo foi mapear questões socioambientais prioritárias que influenciam na qualidade de vida das pessoas e que possam auxiliar na proposição de políticas públicas especificamente voltadas a essa temática. A Pesquisa de Opinião Socioambiental Manauara mostrou que, para 72,6% dos entrevistados, a floresta em pé significa mais qualidade de vida e é sinônimo de fonte de desenvolvimento para o estado do Amazonas. Outro destaque foi o fato de que 85,6% dos manauaras não acreditam no discurso de que é preciso desmatar para desenvolver.



A pesquisa foi estruturada em torno de temas como conservação das florestas e áreas verdes, igarapés, queimadas e criação de novas áreas de conservação. Na opinião do superintendente-geral da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), Virgilio Viana, é relevante o fato de que a grande maioria da população é contra o desmatamento, a favor da manutenção da floresta em pé, da criação de novas unidades de conservação e da recuperação de áreas verdes urbanas.


“Isso é uma mensagem muito importante para todas as lideranças políticas estaduais, nas diferentes esferas de governo, para observarem como nós devemos dar mais importância à proteção ambiental. É extremamente positivo que a população tenha essa visão de entender a floresta em pé como tendo mais valor”, enfatiza Viana.


Jornada para uma cidade verde


São inúmeros os problemas ambientais que atravessam a cidade amazônica. Com pouco mais de 2 milhões de habitantes, Manaus é marcada por igarapés poluídos, esgotos a céu aberto, inundações frequentes e uma mobilidade urbana fragilizada. Além disso, a capital figura na 20ª posição entre as 22 regiões metropolitanas brasileiras no Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), segundo o Atlas Brasil. Mesmo assim, as condições precárias, que não são exclusivas da região e também assolam diversas outras cidades país afora, são, ao mesmo tempo, contrastadas pela presença de áreas verdes, animais silvestres e uma percepção da própria população sobre a importância de se criar e proteger tais espaços. 


De acordo com 67,6% dos entrevistados, as florestas afetam muito positivamente a qualidade de vida, principalmente pela melhora na qualidade do ar e pela redução da sensação de calor. Além disso, 87% dos manauaras acreditam que a despoluição dos igarapés – nome de origem tupi que significa, literalmente, “caminho de canoa” – nas áreas urbanas de Manaus é importante ou muito importante. Atualmente, esses cursos d’água estão contaminados por esgoto não tratado e são dominados por grandes quantidades de lixo – problema que se agrava ainda mais durante os períodos de cheia do Rio Negro, que “arrastam” os resíduos até os igarapés.


No último censo realizado pelo IBGE em 2010, Manaus e Belém eram as duas capitais com o menor percentual de arborização urbana entre 15 cidades brasileiras com mais de 1 milhão de habitantes. De acordo com a pesquisa da Action, na opinião da maior parte dos moradores, tanto o poder público quanto a população devem criar consciência ambiental, para evitar que as árvores das áreas urbanas sejam derrubadas e imputar esforços para aumentar a arborização em vários pontos da cidade. Segundo Viana, os resultados ajudam a compreender o fato de que a população está no caminho certo ao afirmar que a qualidade de vida está associada diretamente à conservação ambiental. 


“Talvez a melhor e mais direta relação seja com o tradicional banho de igarapé, que faz parte da cultura da Amazônia”, destacou. “Mas para que isso seja mantido, é essencial ter a floresta em pé, porque as nascentes dos igarapés têm que estar protegidas por florestas para manter a água limpa e fluindo em quantidades necessárias para manter esse importante espaço de lazer às populações urbanas”.


 


Conservação, economia e queimadas


Há pelo menos 19 unidades de conservação presentes na cidade de Manaus, sendo que 12 delas são áreas protegidas municipais geridas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas). Um dos dados mais relevantes ilustrados na pesquisa foi de que 73,5% da população consideram que novas áreas de conservação não atrasam o desenvolvimento econômico – 15,5% não souberam avaliar a questão e apenas 3,3% avaliaram que esse tema atrasa muito o desenvolvimento.


Para 87% da população, a criação de unidades de conservação também está interligada com a importância da preservação de espécies-bandeira, como o sauim-de-coleira (Saguinus bicolor), um sagui encontrado em parte da Amazônia brasileira, incluindo a cidade de Manaus. Outros argumentos a favor da criação de novas unidades de conservação foram de que existem alternativas para desenvolver sem precisar desmatar, como atividades de manejo e de extração de produtos florestais, mas que, para isso, é necessário mais investimento em educação, pesquisa e desenvolvimento.


As queimadas também são um fator que agrava a quantidade de gases de efeito estufa na atmosfera e prejudicam a saúde dos habitantes locais. 94,1% das pessoas ouvidas acreditam que as queimadas exercem impactos negativos na qualidade de vida. Alguns dos motivos citados levam em conta a poluição do ar provocada pela fumaça, o fato de prejudicar o meio ambiente e a fauna e ocasionar problemas respiratórios, além do aumento da temperatura. Aqueles que não veem esse fator como um problema argumentam que as áreas queimadas são distantes e, portanto, não afetam sua qualidade de vida.


Pesquisa Action


Em tempos de mudanças climáticas e de uma preocupação internacional cada vez mais explícita quanto à proteção da floresta amazônica, é evidente que a temática do meio ambiente tem ganhado cada vez mais espaço em pesquisas de opinião pública. Na opinião da diretora de pesquisas da Action, Flávia Sausmikat Soares, é de suma importância conhecer a percepção das pessoas que residem na Amazônia brasileira. 


“A pesquisa visa conhecer de que forma as pessoas se sentem beneficiadas pela preservação da natureza e por manter a floresta em pé. Fica evidente que os manauaras reconhecem a importância da floresta em pé, da conservação dos igarapés, das águas e dos rios, e os resultados da pesquisa mostraram que a população associa a preservação das florestas a um clima mais ameno e um ar mais limpo para respirar. As pessoas querem que isso continue e não seja destruído, evitando águas poluídas. Há um desejo forte de que a floresta continue a existir”


Os dados foram coletados por meio de aplicação de um questionário estruturado de modo presencial (face a face), nas residências dos entrevistados. Foram realizadas 1.003 entrevistas quantitativas, cuja margem de erro amostral para um intervalo de confiança de 95% é de 3,0% para mais ou menos. A pesquisa também considerou recortes por classe socioeconômica, sexo, escolaridade, raça e região da cidade. Para o método qualitativo exploratório, foram realizadas 15 entrevistas em profundidade com pessoas de diferentes classes socioeconômicas, sendo cinco da classe A, cinco da classe B e cinco da classe C.

Fonte: Redação com informações da FAS